A revolução no mercado de seguros

Mesmo com o advento de novas tecnologias, elemento humano ainda é parte importante do processo de contratação

Os internautas de São Paulo são os que mais pesquisam o termo “seguros” no Brasil, de acordo com o Google Trends. O levantamento abrange consultas desde 2004 aos dias atuais.

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Quando elevamos a escala em nível global podemos perceber o quanto ainda existe espaço para desenvolvimento do mercado de seguros no Brasil. A Argentina, por exemplo, registra mais do que o dobro de pesquisas sobre o assunto. A Venezuela, em grave situação econômica, tornou-se o país latino-americano que mais procura conhecer este setor através da web.

Porto Alegre é a sétima cidade brasileira onde mais são realizadas pesquisas. Estão à frente cidades como Santo André, Brasília e Joinville. Para Marcelo Blay, presidente da Minuto Seguros, o “boom” das pesquisas sobre corretoras de seguros não é uma surpresa. “As pessoas estão em busca de alternativas quando querem adquirir um produto ou serviço. Este comportamento é percebido em diversas indústrias, sejam de bens de consumo ou de serviço”, constata.

Com as vendas em crescimento, a Minuto Seguros chamou a atenção da Redpoint e.ventures, um fundo de investimento do Vale do Silício, na Califórnia, que passou a investir e apoiar a evolução da corretora. Formado em Engenharia pela Escola de Engenharia Mauá, com MBA em Finanças pela FGV e especialização na Columbia University (NY), Marcelo Blay trabalhou por 10 anos na Porto Seguro e foi vice-presidente (COO) da Itaú Seguros por seis. É Coordenador do Comitê de Tecnologia do Sindicato dos Corretores de São Paulo e Vice-Coordenador do Comitê de Seguros na Câmara Brasileira de Comércio Eletrônico.

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 Confira a entrevista realizada com o presidente da maior corretora de seguros multicanal do Brasil:

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    Marcelo Blay trabalhou por 10 anos na Porto Seguro e foi vice-presidente (COO) da Itaú Seguros por seis. Divulgação

    JRS: As corretoras de seguros são mais pesquisadas que as próprias companhias seguradoras, de acordo com o Google Trends. Isso é uma surpresa?

Marcelo Blay: Não acredito que seja uma surpresa, mas sim, uma constatação de que as pessoas estão em busca de alternativas quando querem adquirir um produto ou serviço. Este comportamento é percebido em diversas indústrias, sejam de bens de consumo ou de serviço.

Com o advento da internet, a informação ficou ao alcance de todos e os consumidores passaram a ter o poder da escolha e da comparação, de forma simples e descomplicada. Neste contexto, os corretores são vistos como os especialistas no tema dos seguros, isto é, os consultores que agem em prol do cliente na seleção da melhor oferta para sua necessidade específica. Pelo fato do seguro ser um produto financeiro relativamente complexo, intangível, geralmente com prazo de duração longo e com linguajar técnico muito peculiar, os consumidores se sentem amparados pelo corretor na tomada de decisão sobre qual seguradora escolher, sendo capazes de interpretar a necessidade do cliente, traduzindo-a numa combinação de coberturas, serviços, valor e seguradora mais adequada, maximizando a relação custo/benefício para o cliente.

  • JRS: Países em crise tendem a procurar mais informações sobre seguros?

MB: Em momentos de crise econômica e política, observamos dois fenômenos interligados. O primeiro deles é a suposição que momentos assim geram mais violência urbana, seja pelo aumento da criminalidade e/ou aumento de manifestações de rua, colocando o patrimônio pessoal em risco. O segundo fator é o aumento do desemprego. A perda de um bem de alto valor, como o caso de um automóvel, atrelado à perda do emprego, afeta o patrimônio individual significativamente. Em momentos de crise, o veículo é um ativo pessoal que pode ser transformado em liquidez para cobrir necessidades mais imediatas, portanto a busca por seguros se intensifica no sentido de ser um instrumento financeiro adequado à mitigação de risco.

  • JRS: São Paulo é referência no ramo segurador, mas alguns estados ainda não possuem uma forte cultura sobre o mercado de seguros. Como reverter isso?

MB: Realmente temos disparidades regionais com relação à penetração de seguros na economia. Este é um fenômeno conhecido, que se observa com relação a países também. Existem diversos estudos que correlacionam a renda com a participação da indústria de seguros no PIB: quanto maior o PIB per capita, maior o percentual de seguros na economia como um todo. Como temos grandes disparidades econômicas regionais no Brasil, observamos a mesma discrepância. As formas de reverter esta situação são várias. Obviamente, a retomada do crescimento econômico vem em primeiro lugar, seguida de melhor distribuição de renda. Paralelamente, temos a difusão da cultura do seguro, tão necessária em um país onde o nível educacional ainda deixa a desejar como um todo, o que dizer com relação à educação financeira, praticamente inexistente. Finalmente, o controle da inflação fecha o grupo de ações necessárias para que consigamos difundir a cultura securitária no país.

  • JRS: As corretoras online cada vez mais chamam a atenção dos consumidores. O setor de seguros vive uma revolução?

MB: O mercado de seguros, assim como todas as atividades econômicas, está passando por um momento interessante de mudanças. Temos visto várias indústrias sendo repensadas a partir do surgimento de novas tecnologias como o Airbnb desafiando a indústria hoteleira e o Uber na área de transporte de passageiros.

O que tem acontecido no mercado de seguros? Em geral, imagina-se que a revolução virá do lado da forma de distribuição, isto é, das vendas. Sem dúvida que esta passa por transformações, mas a complexidade dos produtos e a falta de conhecimento a respeito do seguro em si fazem com que o elemento humano ainda seja parte importante do processo de contratação. Até o Google, gigante do mundo da tecnologia decidiu interromper sua incursão no mundo da venda de seguros pela internet, pois chegou à conclusão que os clientes precisam de um apoio humano durante e após o processo de contratação, fugindo do conceito totalmente online da empresa.

O mercado brasileiro ainda está em uma fase muito embrionária em termos de aproveitamento de todo potencial que a tecnologia pode trazer quando em comparação com modelos de outros países. Atualmente, temos basicamente processos de cotação, transmissão e poucas outras operações via webservice. Se as seguradoras conseguissem integrar os sistemas de suporte à venda (como vistoria prévia, transmissão e emissão, por exemplo) e de pós-venda (endosso, sinistro e resolução de inúmeras pendências), teríamos uma grande redução de custo operacional, tanto do lado das seguradoras, como das corretoras. Essa economia poderia ser revertida para preço, transferindo o benefício para os consumidores, permitindo que mais clientes tenham recursos para comprar o produto, ampliando ainda mais o mercado e favorecendo ganhos de escala. Isso por si só seria revolucionário.

  • JRS: Qual o tipo de seguro mais contratado na Minuto Seguros? A que atribui este resultado?

MB: Nossas vendas na Minuto Seguros refletem o que acontece como um todo na indústria de seguros. Vendemos praticamente todos os produtos para pessoa física (automóvel, residencial, vida individual, viagem, equipamentos portáteis, etc.), bem como aqueles para as pequenas e médias pessoas jurídicas (patrimoniais, saúde e odontológico empresarial, vida em grupo, etc.). A distribuição das vendas destes produtos se dá na mesma proporção que observamos nas estatísticas do setor: para pessoa física a liderança disparada é ocupada pelo seguro de auto e na jurídica pelo seguro saúde empresarial.

  • JRS: Como a crise brasileira afetou as atividades da empresa?

MB: A crise afetou o poder de compra do brasileiro. Percebemos que o prazo para a decisão de compra se ampliou, bem como a busca de maior parcelamento para os pagamentos. A pressão por descontos se intensificou acentuadamente também. A crise fez com que buscássemos redução de despesas e otimização operacional, dado que, para manter sua participação de mercado, muitas seguradoras reduziram seus preços e os consumidores pressionaram por redução de preços, comprimindo as margens das corretoras.

  • JRS: A tecnologia auxilia na disseminação dos produtos do setor de seguros?

MB: Não acredito que a tecnologia auxilie diretamente na disseminação dos produtos de seguros. Entendo que a tecnologia seja um fator crítico para simplificação de processos e redução de tempo das diversas atividades específicas, desde a cotação até a indenização, sem deixar de citar questões ligadas à precificação e subscrição de riscos. O processamento de grandes bases de dados (big data) permite uma grande sofisticação na análise de riscos, sinistros e fraudes. Acredito que o conjunto destas atividades impactadas pela tecnologia contribua para economias e ganhos de escala para as seguradoras que podem ser convertidos em preços mais competitivos, ajudando a ampliar a base de clientes. Desta forma, indiretamente, a tecnologia ajuda a aumentar o leque de consumidores de seguros.

  • JRS: Quais ações da Minuto Seguros podemos esperar para o final de 2016?

MB: Estamos focados na busca de melhorias operacionais. O momento clama por uma grande revisão de processos para a busca de otimização e simplificação das tarefas. A redução do custo operacional é imperativo para enfrentar a situação de compressão de margens a aumento de despesas em função de inflação e perda do poder aquisitivo dos clientes, sem comprometer a excelência na prestação de serviços.

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