As relações comerciais da era Bolsonaro

Já é possível identificar oportunidades e perigos da nova agenda governamental

O novo Presidente da República finalmente foi empossado. Agora tem, além do aval da sociedade, poder necessário para levar a cabo seu plano econômico. É verdade que ainda não se sabe muito sobre os detalhes das suas agendas positivas e negativas, mas as linhas gerais começam a ganhar contornos mais definidos e já é possível identificar algumas oportunidades e perigos, principalmente quando se trata de comércio internacional.

Publicidade
Icatu Seguros no JRS

O contexto externo não é dos mais amigáveis: a tensão entre China e Estados Unidos parece ter cessado, mas isso não deve durar por muito tempo. A expectativa para o crescimento do PIB de ambos os países em 2019 é menor do que a de 2018, segundo o FMI. É de se esperar, portanto, uma segunda rodada de embargos ao longo dos próximos meses. O Brasil, além de lidar com os problemas internos, não pode contar com um ambiente externo inclinado a abertura comercial.

Ciente desta dificuldade, o atual Ministro da Economia manifestou a intensão de priorizar acordos bilaterais em detrimento de políticas multilaterais ou acordos com blocos. Os esforços para a aproximação com Israel e Estados Unidos, as atitudes pouco amistosas com os Estados sul-americanos e a indiferença em relação à China têm mostrado o tom da nova política externa.

O grande risco da nova política não reside na mudança de uma abordagem plural para singular, mas nos determinantes desta aproximação, que são menos econômicos do que políticos. O mesmo não se pode dizer sobre os efeitos que dela decorrem. Se olharmos para o Oriente Médio, por exemplo, que é o segundo maior comprador de proteína animal do Brasil, enquanto Israel é o destino de menos de 1% das exportações brasileiras. Os países com predominância muçulmana que se sentem incomodados com a iminente mudança da embaixada brasileira de Tel Aviv para Jerusalém são o destino de 1/3 da exportação de carne de frango e ¼ das exportações de carne bovina. Não à toa, os exportadores brasileiros têm pressionado Jair Bolsonaro para que mude de ideia.

Publicidade

Outro país alvo da mudança de postura é os Estados Unidos. As manifestações de Bolsonaro favoráveis à aproximação podem criar novas vias comerciais entre as duas nações. O fato é que o Brasil tem passado imune a todos os conflitos internacionais desde a segunda Grande Guerra e isto lhe rendeu a simpatia de várias nações amigas. Da forma como a aproximação é construída, canais importantes do comércio externo podem ser obstruídos para produtos nacionais.

Não há, na história recente brasileira, uma guinada nas relações internacionais como a que estamos presenciando. Todo o esforço para construir novos laços comerciais deve ser bem-vindo, mas a contrapartida da nova política internacional pode ser um ônus econômico que não queremos (e nem podemos) arcar.

CARTA DO GESTOR: Na ausência de reformas, otimismo é ruído

Dezembro foi de intensa volatilidade no cenário externo, como poucas vezes vista para o último mês do ano, o que trouxe uma má e outra boa notícia. O ponto positivo é que tomou corpo a percepção de descolamento do mercado brasileiro frente às economias avançadas e demais economias emergentes. Longe de representar um prêmio por fundamentos diferenciados, a MAPFRE Investimentos atribui tal movimento ao crescente diferencial de expectativas em relação ao desempenho da economia brasileira, que embutem ligeira aceleração de 0,5% a 1,0% no PIB e aprovação de reformas estruturantes, como a da previdência, tributária, administrativa, privatizações entre outras, bem como o cenário político qualitativamente melhor do Brasil frente a emergentes de peso como México e Turquia aos olhos do smart money internacional, o qual, nem sempre, se revela tão smart assim.

Já a má notícia é, por um lado, os crescentes sinais de desaceleração das principais economias, sobretudo as da Europa, Japão e China, e por outro, a dos EUA, que apesar de seguir com mercado de trabalho e imobiliário firmes, apresenta um déficit fiscal crescente e um estoque de dívida corporativa em suas máximas justo em um ciclo ainda não concluído de elevação das taxas de juros. Some-se a isso a guerra comercial sino-americana, indefinições quanto ao Brexit, redução dos estímulos monetários por parte do FED e do BCE e a derrocada dos preços do petróleo e temos um bom motivo para vender ativos de risco, o que levou os índices acionários americanos a quedas superiores a 20% desde os picos.

Este pano de fundo nos apresenta uma oportunidade e um risco. A oportunidade é a de tirar proveito do momentum positivo dos ativos brasileiros e comprar seguro para proteção a baixo custo. A continuidade deste momentum – que segue em curso no exato instante– apenas há de perdurar caso as tão esperadas reformas do novo governo saiam do papel. Eventuais atrasos ou esvaziamentos nos pacotes a serem aprovados tendem a ampliar o fosso entre a expectativa e a realidade, e é justamente aí que reside o risco. Mais: a continuidade de leituras de indicadores de atividade negativas na margem para o conjunto das economias avançadas e juros maiores que os previstos nos EUA devido a estresses imprevistos na financiabilidade de sua dívida – aliada à ausência de medidas concretas para a economia brasileira – pode introduzir no cenário um temível cisne negro tal! ebiano*, motivo de nossa constante procura de meios flexíveis e baratos de proteção.

Entretanto, como cenário básico e mais provável, a MAPFRE Investimentos espera que o novo governo terá êxito na aprovação da maioria de suas propostas, assim como no cenário externo a expectativa é de arrefecimento da guerra comercial com a China e a sustentação da atividade econômica nesta última, o que deve beneficiar as commodities exportadas pelo Brasil e o desempenho de seus ativos frente aos demais pares emergentes. Assim sendo, a gestora segue com a estratégia de sensível aumento na alocação em ações nos multimercados, privilegiando setores expostos a consumo, construção e bancário como base da carteira, e uma exposição seletiva e menor a nomes mais alavancados e ainda relativamente estressados, embora com maior potencial de retorno.

Já no mercado DI, a expectativa de continuidade no fechamento dos prêmios nos vértices mais longos, com perturbações nesta trajetória concebíveis apenas em caso de fracasso na reforma da previdência ou turbulências mais fortes no cenário externo.

*Cisne Negro: termo usado pelo filósofo, escritor e trader quant naturalizado americano Nassim Nicholas Taleb para designar eventos de cauda, altamente improváveis e de elevado impacto.

Artigos Relacionados