Seguro Paramétrico foi tema de debate na ANSP

Palestrantes discutiram os efeitos climáticos, evolução de tecnologias e oportunidades para o nicho

Na última quarta-feira (22), a Academia Nacional de Seguros e Previdência – ANSP discutiu o tema “Seguro Paramétrico”. A live foi apresentada pelo diretor de Fóruns Acadêmicos e coordenador de comissão de seguros de crédito, garantia e fiança locatícia do SINCOR-SP e FENACOR, Edmur de Almeida, que também foi responsável pela coordenação do evento, e pelo Presidente da ANSP, João Marcelo dos Santos. A moderação ficou por conta Alfredo Chaia, membro da cátedra de Gerência de Riscos e executivo titular da International Risk Veritas Consultoria. Os participantes abordaram as transformações que a sociedade está experimentando, novos mercados e novas metodologias de produção e consumo, em uma edição do Café com Seguro Live.

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Durante a abertura do evento, Edmur manifestou o seu otimismo quanto à possibilidade dos seguros paramétricos se tornarem instrumento altamente difundidos, capaz de ampliar o rol de coberturas disponibilizadas pelo mercado de seguros à sociedade.

João Marcelo comentou a sua expectativa de que a utilização de parâmetros, tanto para a subscrição de risco quanto para o pagamento de sinistros, vai se difundir muito. Isso a ponto de de a granularidade e a eficiência dos parâmetros, somados a inovações como o blockchain, a internet das coisas e os smart contracts , tornarem esses elementos relevantes usuais na maioria dos contratos de seguro. Ele também comentou o fato de ter acabado de se iniciar a audiência pública para discutir a norma que, finalmente, desvinculará seguros de grandes riscos e massificados para fins de regras contratuais impostas pela legislação, o que é importante para todos os produtos, inclusive os seguros paramétricos.

O Acadêmico Alfredo Chaia considera que seguro paramétrico é outra forma de indenizar, já que não objetiva indenizar perdas, pura e simplesmente. Introduzindo o tema para os participantes da live o executivo destacou que as discussões sobre riscos e seguros precisam refletir a nova realidade que o mundo enfrenta e se ajustar para endereçar riscos emergentes ou situações tradicionais que agora passam a ter uma nova dimensão. “O seguro paramétrico se mostra como uma das soluções para essa realidade”, disse.

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Icatu Seguros no JRS

Em sua apresentação, a diretora de meteorologia do Climatempo, Patrícia Madeira, trouxe dados importantes sobre a frequência e a dimensão dos efeitos dos eventos da natureza no nosso cotidiano e também nas produções agrícolas e de energia eólica.

Eventos extremos ocorridos em 2019, temperaturas acima da média nos 5 continentes, causaram grandes impactos no Brasil e principalmente na América. Os EUA tiveram 14 eventos climáticos e contabilizaram perdas superiores a U$ 1bi. Alguns deles superaram esse montante. As cheias do Rio Missouri e do Rio Mississippi, por exemplo, ocasionaram prejuízos de mais de U$ 10Bi

De 2005 a 2019, período em que a maior parte dos eventos aconteceram, os valores estão na casa de U$1 trilhão – U$1.75 tri foram consumidos por esses eventos metereológicos. “E há uma tendência do aumento número de eventos”, estimou a profissional.

No Brasil, os eventos climáticos acontecem em diferentes proporções e magnitudes dos que ocorrem nos Estados Unidos, porém com danos financeiros igualmente avassaladores. Em Abril de 2019 volumes altíssimos de chuva ocorridos na cidade do Rio de Janeiro resultaram em pessoas ilhadas, carros quase submersos ou sendo levados pela forte correnteza que se formou pelas ruas da cidade e em muitos prejuízos. Em quatro dias choveu de 100 a 200mm em vários bairros da capital, superando a média local para o mês de Abril. “É um volume absurdo, não há cidade que suporte. A rede de drenagem não está preparada para tanto. Em 24hs choveu mais do que chove em um mês inteiro”, analisou a diretora.

De acordo com dados da Climatempo, no início desse ano choveu-se muito acima da média no Ceará, no Rio Grande do Norte e na Bahia, principais estados geradores de energia do Nordeste do Brasil. Como consequência, houve uma diminuição significativa da produção eólica, principalmente no mês de março. “Tem o lado positivo. Em Sobradinho, que é geração hidráulica, encheu. Os açudes de uma forma geral ficaram bem abastecidos depois desse período úmido. Mas o fato é que no interior do Ceará, do Rio Grande do Norte e da Bahia houve grande diminuição da produção eólica”, ponderou Patrícia.

Em sua fala, o advogado, consultor jurídico e professor Pery Saraiva Neto, contextualizou questões relacionadas às mudanças climáticas e adaptação a elas, assim como alguns aspectos jurídicos. Ele também fez referência ao Acordo de Paris (2015), pelo qual a comunidade internacional entrou em um consenso no que diz respeito ao aumento de calor no planeta e a necessidade de adaptação. Para ele, um ponto de partida seria um consenso sobre as mudanças climáticas em relação aos seguros paramétricos. “O gatilho agora passa a ser a expectativa do prejuízo”, enfatizou.

De acordo com o executivo, todos os países precisam se organizar no sentido de aumentar a capacidade de resiliência e reduzir as vulnerabilidades. Isso porque esses são os dois grandes comandos chaves onde tudo começa a se estruturar e os seguros paramétricos também entram nesse plano de adaptação. “A história dos seguros é a história da inovação, da capacidade e da construção de soluções para enfrentar os riscos”, salientou.

Pery ressalta ainda o potencial que o seguro paramétrico tem de atender às populações de menor capacidade financeira e econômica em razão da redução dos custos operacionais. Segundo ele, aspectos como inacessibilidade às vistorias, regulação de sinistro e o alcance de grandes distâncias são obstáculos superados nessa modalidade de seguro.

“Temos, entretanto, dois grandes desafios: fazer se compreender o que é o mecanismo de parametrização e construir bases teóricas e normativas para tonar a regulamentação mais clara. Temos que avançar um pouco e repensar a figura do princípio indenizatório. É necessário passar pela reconfiguração do princípio indenizatório nos seguros de danos quando dialogados com os seguros paramétricos, que trabalham com mecanismos estimados de perdas. Digo isso porque no Brasil isso tudo é muito insipiente”, finalizou o advogado.

Na opinião do subscritor de seguros paramétricos para agricultura e energia na Swiss Re, Daniel Pereira, as tecnologias utilizadas para esse nicho evoluíram significativamente nos últimos três anos. O que é muito positivo, tendo em vista que esse é um ramo que necessita de tecnologia e de transpor a barreira cultural para se solidificar de vez no mercado. Ainda assim, ele acredita que o mercado ainda careça de uma boa dose de inovação.

Quanto à diferença entre derivativo climático e seguro climático, Daniel destacou que o seguro considera situações que são mais catastróficas, eventos que tem tempo de retorno um pouco maior. “Quando você procura uma seguradora para se proteger de um evento climático anômalo, ela estuda exatamente o seu local de risco, a sua cultura ou a máquina que você usa para gerar energia. O seguro tem flexibilidade para atender às necessidades específicas do cliente”, reiterou o executivo.

Para dar aos internautas uma visão mais exata do que realmente está acontecendo atualmente dentro das seguradoras brasileiras, o subscritor falou sobre as áreas de onde existem mais demandas pelo seguro paramétrico, assim como alguns os índices seguráveis. No setor de agricultura, por exemplo, seca agrícola, excesso de chuva, excesso de temperatura e índice de biomassa são os índices de maior procura, de acordo com dados do subscritor.

Empresas da área de energia e hidrelétricas, por sua vez, tendem a optar por proteção contra queda de velocidade de vento, irradiação solar e a baixa quantidade de água armazenada, pois esse volume tem relação direta na capacidade de geração de energia.

“O seguro paramétrico não deve ser visto como uma solução por si só. Para mim ele é muito mais uma solução que complementa ao seguro tradicional do que uma solução única”, afirmou Pereira.

Para o executivo, essa modalidade é uma boa alternativa para seguros agrícolas, como no caso de localidades em que as seguradoras não oferecem cobertura para determinado risco e para áreas de fronteira agrícola, onde é difícil encontrar peritos para fazer visita e regular sinistros. É também uma possibilidade para os agricultores que se utilizam de meiosi – sistema de rotação de cultura com a cana adquiram proteção para suas safras. Muitas companhias negam apresentação, não aceita, por exemplo, que a soja seja plantada no ano seguinte a plantação de cana. O seguro paramétrico é, ainda, uma excelente opção para resseguradoras e para criação de produtos inexistentes.

Encerrando as apresentações, Carlos Branco, Gerente Regional de seguros da Cargill para a América Latina, destacou o papel do seguro como um instrumento de reconstrução/proteção social e ressaltou a importância da propagação de sua cultura. Segundo ele, parte significativa da agricultura nacional não é assegurada de maneira alguma. “O seguro paramétrico se coloca como um instrumento de proteção para a sociedade, reduzindo as vulnerabilidades e aumentando a resiliência. É uma experiência não só para alavancar negócios, mas também para garantir a produção de alimentos do Brasil”, afirmou.

Levando em conta a diversidade do país, Branco nota uma evolução do seguro paramétrico. O executivo justifica sua ideia no fato de que, embora ainda existam produtores tradicionais que se arriscam em relação às intempéries da natureza, já existem também muitos produtores digitais que se utilizam da tecnologia para se preparar para eventualidades e ter maior controle sobre suas produções.

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