Seguro liga e desliga: análise e considerações ao longo de 2020

Artigo é do advogado Luiz Felipe Amabile Loch, da CJosias & Ferrer

Em agosto de 2019, a Superintendência de Seguros Privados (Susep) publicou no Diário Oficial da União sua Circular 592, a qual “Dispõe sobre a estruturação de planos de seguros com vigência reduzida e/ou com período intermitente”, também conhecido como Seguro Liga e Desliga e Seguro Pay Per Use.

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Em comunicado da autarquia à época da publicação, referida circular tem como objetivo “adequar os produtos de seguro às reais necessidades do consumidor”.

A Circular 592, em específico, autorizou e estabeleceu regras e medidas para que as seguradoras ofereçam duas novas modalidades de seguro: o intermitente e o de vigência reduzida. Os conceitos de ambos estão expressos no artigo 2º da norma, nos incisos I e II, respectivamente:

Art. 2º Considerar-se-ão, para efeito desta Circular, os seguintes conceitos:
I – vigência reduzida de contrato: quando o período de vigência é fixado em meses, dias, horas, minutos, jornada, viagem ou trecho, ou outros critérios passíveis de contratação, conforme estabelecido no plano de seguro;
II – período intermitente: é o período em que o segurado ou beneficiário encontra-se efetivamente amparado pela cobertura contratada, fixado de forma descontinuada por determinado(s) critério(s) de interrupção e recomeço, bem como inclusão ou exclusão de cobertura dos riscos;

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Em suma, essa nova forma permite que os segurados ativem, alterem ou pausem sua cobertura de seguro com apenas um clique, mediante aplicativo no smartphone. A ideia, aqui, é clara: consumidor pagar tão somente a cobertura que deseja, e apenas quando entender ser necessário.

Tal regramento abriu ao mercado securitário, portanto, uma inovadora possibilidade de comercialização do produto de forma mais flexível, uma vez que anteriormente as coberturas para seguro automotivo tinham vigência obrigatória de 1 (um) ano.

Em virtude do pouco tempo de comercialização no Brasil, é arriscado sermos taxativos acerca das vantagens e desvantagens sobre a nova modalidade. Contudo, é inegável que tais produtos trouxeram uma nova opção de consumidores para as seguradoras. Seja pelos altos valores do prêmio pago para a contratação de um seguro anual ou o tipo de utilização que é dada ao automóvel, muitas pessoas não se sentiam interessadas em arcar com a despesa elevada das coberturas tradicionais. Mas sem dúvida, estamos diante de uma modalidade pensada para aumentar o acesso ao seguro para que as pessoas contratem quando tenham real necessidade, a um valor que se estima seja considerado mais acessível.

Outro fator que certamente as seguradoras estão considerando é a pandemia de Covid-19, que trouxe significativa queda de renda e consequente aumento de incertezas quanto ao futuro, bem como considerável diminuição do uso do veículo, alterando, assim, o perfil de preferência dos contratos de seguro do ramo automotivo. O consumidor tem optado por apólices mais enxutas, que abrangem tão somente coberturas para roubo e furto. Ou seja, estamos diante de uma alteração da forma em que as pessoas passarão a contratar o seguro de automóvel.

Porém, após quase 18 meses de comercialização do produto, é possível encontrar, através de simples pesquisa em sites do mercado, entrevistas de diretores de algumas seguradoras, alertando os consumidores que o produto pode custar mais caro que o seguro tradicional, valendo a pena tão somente quando o segurado fizer uso do veículo por raríssimas e escassas vezes. Um dos fatores que pode tornar o custo alto do “Liga-Desliga” é a concentração da utilização do bem apenas em momentos de riscos, dentre outros.

Outro obstáculo que vem sendo muito debatido é a necessidade de intervenção direta do segurado no “Liga-Desliga”. Deixou o carro na garagem? Clica e desabilita a cobertura no aplicativo. Saiu com o veículo? Aciona cobertura completa. Por vezes e não tão raro, há relatos de casos de segurados que “esqueceram” de acionar a cobertura. Ao contratar o seguro, o consumidor, na maioria das vezes, nem lembra quando findará a vigência da sua apólice. Imagine, então, ter que ficar lembrando toda hora de ‘ligar e desligar‘ o seguro. Ou seja, aquilo que tinha tudo para ser o fator revolucionário, corre o risco de, por vezes, ser um dos principais problemas.

Apresentadas eventuais vantagens e problemas, alguns questionamentos que ficam: podemos afirmar que o seguro na modalidade “Liga-Desliga” é uma tendência? Sua comercialização resultará em diminuição de pagamentos de prêmios às seguradoras, uma vez que os segurados estão utilizando cada vez menos os veículos? Ou ao contrário, tal inovação será responsável pela criação de um novo nicho, um novo tipo de consumidor, que anteriormente não contratava seguro por achar excessivamente oneroso?

Pelo pouco tempo de amostragem, é cedo fazer qualquer tipo de afirmação taxativa acerca do tema. Mas é incontroverso que a pandemia acelerou, e muito, o êxito na comercialização do produto, uma vez que, isoladas, as pessoas passaram a necessitar menos do uso do carro. Contudo, apesar dela, diante da tendência de as empresas serem cada vez mais digitais e os consumidores estarem cada vez mais exigentes nas facilidades de contratação e compras de produtos, nos resta aguardar para verificar se a nova modalidade vai substituir o seguro tradicional ou, ao contrário, será apenas um complemento na carteira de produtos oferecidos pelas seguradoras.

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