CNseg destaca a conscientização do autismo 

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Confederação conversou com Flávia Poppe sobre a respeito do transtorno

No Mês do Autismo a CNseg conversou com Flávia Poppe uma das fundadoras do Instituto JNG. Durante a entrevista, Flávia aborda os projetos que trazem autonomia às pessoas com deficiência intelectual. Confira:

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Estima-se que no mundo existam pelo menos 70 milhões de indivíduos com autismo. Deste total, possivelmente 2 milhões são brasileiros. Não existe, no entanto, um levantamento oficial sobre a incidência do transtorno no país. O censo demográfico de 2020 deverá ser o primeiro a trazer estes dados.

O Transtorno do Espectro do Autismo (TEA) engloba uma série de desordens do desenvolvimento neurológico que resultam em dificuldades na comunicação e capacidade de interação social. O termo espectro é adotado no Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5) para indicar que a condição se manifesta em diferentes graus.

O mês de abril foi escolhido para trabalhar a conscientização acerca do autismo. Para falar um pouco sobre o TEA e os desafios enfrentados por pessoas com outras deficiências intelectuais, convidamos Flávia Poppe, uma das fundadoras do Instituto JNG.

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– Flávia, você é uma das fundadoras do Instituto JNG. Como surgiu a iniciativa e qual o principal objetivo do projeto?

A iniciativa do Instituto JNG ocorreu quando eu e duas outras mães de jovens adolescentes dentro do espectro do autismo vislumbramos o fim da etapa escolar. Onde eles terminariam a escola, como qualquer adolescente, mas sem a perspectiva de continuar o ingresso em uma universidade, porque a condição deles apresentava certa limitação intelectual onde o caminho mais tradicional de um jovem que quer se profissionalizar não ocorreria.

Então, o Instituto nasce com uma proposta de pensar como se dará a passagem para a vida adulta desses jovens. Como eles vão se capacitar, se ocupar e trabalhar. Já naquele momento, alguns anos atrás, quando discutíamos propostas para o instituto, a pergunta central foi “Onde é que eles vão morar? Como eles ficam quando nós, pais, não estivermos mais aqui?”. Esse foi o propósito da criação do Instituto JNG.

– Um dos grandes mitos sobre pessoas com deficiência intelectual, incluindo os autistas, é que elas não podem trabalhar. O que você diria a esse respeito com base em toda a sua experiência no Instituto?

É de fato um mito. Não há nenhuma evidência quanto a isso – muito pelo contrário! Cada vez mais, desde que surgiram as leis de cotas, existem pessoas com deficiência intelectual que estão trabalhando, incluindo as pessoas com autismo. Isso é uma tendência em todos os países avançados. Cada vez mais se percebe, não apenas o ganho para essas pessoas com deficiência, mas principalmente os ganhos para as organizações que se dispõem a ter essa experiência. Há muitos estudos que confirmam o ambiente positivo que as organizações passam a ter devido ao convívio com indivíduos que precisam de mediação eventual para desempenhar as suas funções.

Portanto, não é acolher uma pessoa com deficiência numa organização apenas com o sentimento de compaixão. É muito importante que se faça uma revisão das competências e processos que existem na empresa para encaixar aquela habilidade específica que uma pessoa com deficiência tem para agregar valor à organização, à equipe e aos seus colegas.

– O instituto JNG tem como proposta trazer autonomia para as pessoas que possuem algum tipo de deficiência, especialmente as de ordem intelectual. Em que momento os pais devem começar a se preocupar com a independência dos filhos que possuem autismo?

Desde sempre. A autonomia e a noção de independência são coisas que vão se construindo ao longo da vida. Desde que a criança começa a aprender, seja na escola ou nas suas vivências. A forma como os pais olham e lidam com os seus filhos deve ter uma perspectiva de futuro, para que essa pessoa seja orientada sempre na direção da autonomia.

E aqui vale a distinção entre autonomia e independência. Autonomia significa que essa pessoa deve poder fazer escolhas. Isso fazemos desde sempre, mostrando opções e ajudando a criança a entender as consequências de suas escolhas desde que é pequena. Ao longo da vida vamos, naturalmente, aprendendo a escolher. Para uma criança e depois jovem com deficiência não é diferente. Ela precisa desenvolver sua autonomia. Desde que roupa usar, até mais tarde situações e escolhas um pouco mais complexas. Mesmo que ela precise de alguém para executar a tarefa.

Nesse caso, ela tem autonomia e certo grau de dependência. A vida independente de pessoas com deficiência intelectual está diretamente associada ao exercício da autonomia. E a gente sabe que o nível de independência aumenta muito quando os pais permitem, e também quando as escolas e todo o sistema educacional orientam no sentido da autonomia e da vida independente.

– Falando um pouco sobre as ações do instituto, de que forma iniciativas, como o Projeto Piloto, podem trazer qualidade de vida para as pessoas que possuem deficiência intelectual?

O principal projeto do Instituto JNG é conseguir viabilizar e trazer para o Brasil esse modelo de moradia independente. Ou seja, que pessoas com deficiência intelectual ou outros tipos de deficiência possam morar sozinhas com um programa de apoio individualizado.

As ações do JNG estão completamente focadas no que se chama mediação social. É um trabalho mais pragmático, eu diria, entre a visão de especialistas e terapeutas e o dia-a-dia dessa pessoa. Afinal, ela precisa de apoio para poder desempenhar funções básicas da rotina de vida doméstica, como fazer compras, sair à rua, pegar um transporte para chegar ao trabalho.

Isso é o que a gente chama de um programa de apoio individualizado através de mediação social. E o Instituto JNG está trabalhando com bastante empenho para oferecer uma solução completa, integrada. Ou seja, oferecer moradia e o programa de apoio. O projeto de moradia independente é a coroação máxima do que se pretende como uma vida independente. Associando a moradia a uma ocupação laboral, a pessoa com deficiência terá uma vida digna como qualquer adulto.

Será uma pessoa adulta, realizada, inserida na sociedade. É exatamente o que a gente pretende promover e impulsionar no nosso país. Que as famílias e a sociedade de um modo geral compreendam e ajudem para que jovens com deficiência possam adquirir essa confiança e esses recursos se tornando adultos de verdade. Com um programa de apoio eles podem ter uma vida digna, como qualquer pessoa, apesar das suas limitações.

– Para encerrar a nossa entrevista, qual mensagem você gostaria de deixar para pais, mães e a sociedade em geral nesse mês de conscientização do autismo?

Não existe uma pessoa com autismo idêntica a outra pessoa com autismo. Por isso fala-se do espectro. As famílias que estão lidando com crianças psicoatípicas, assim como a sociedade de um modo geral, precisam observá-las. A forma de comunicar e receber informações destas pessoas não usa o caminho tradicional da fala, da síntese, de pergunta e resposta.

Então, isso exige uma atenção, uma observação, uma vontade e uma crença profunda de que essa pessoa tem muita coisa importante a trocar. E por que não, inclusive, a ensinar. Recentemente fizemos um vídeo para o Dia Internacional do Autismo, chamando atenção para esse momento delicado que estamos todos no planeta vivendo com a pandemia do coronavírus. Curiosamente, os aspectos que nos desestabilizaram como sociedade estão sendo a necessidade de um isolamento social, a angústia que muitas pessoas estão vivendo devido à falta de previsibilidade e o fato desta ser uma ameaça invisível.

Pessoas com autismo, algumas décadas atrás, viviam de forma isolada. A falta de previsibilidade costuma ser um dos gatilhos para as crises de pessoas que estão em condição de autismo e que não têm a capacidade de antever, de se tranquilizar diante de uma situação imprevisível. Analogamente é o que estamos todos vivendo, até quando a pandemia nos impuser restrições.

Por fim, a invisibilidade da ameaça com o qual nós hoje lidamos é vivida praticamente todos os dias pelas pessoas que têm algum tipo de deficiência. Porque a discriminação é invisível. A discriminação é um olhar, uma porta fechada, um “não” quando poderia haver um “sim”. Então, acho que nesse mês em que estamos refletindo sobre as pessoas com autismo, na verdade temos muito que aprender com eles.

São pessoas que têm uma forma realmente complexa de existir, devido à deficiência na capacidade de comunicar e interagir socialmente. Temos que dar um passo em direção a eles, assim como eles vêm dando há muitos anos na direção da sociedade, mostrando sua capacidade, as habilidades de que dispõem, suas competências. Não é apenas aquela visão capacitiva de que eles são coitados e de que nós temos que ajudá-los. De forma alguma. Temos que aprender a fazer as pontes, a mediação e trazê-los para perto e estar perto também. Essa é a mensagem que eu gostaria de deixar.

Para mais informações sobre o Instituto JNG, acesse: www.institutojng.org.br

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