Como a guerra na Ucrânia impacta a oferta de crédito para as PMEs brasileiras

Confira análise de Felipe Avelar, fundador e CEO da startup Finplace

Neste mundo globalizado, um conflito armado entre duas nações causa um impacto generalizado na economia e nenhum setor é poupado, independentemente da distância física. O Brasil fica a quase 11 mil km da Ucrânia, mas já sente os efeitos negativos da invasão russa iniciada em 24 de fevereiro, de várias maneiras, entre as quais a instabilidade que leva ao aumento da inflação e das taxas de juros e, em consequência, à redução do crédito.

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Em entrevista à BBC em março, David Malpass, presidente do Banco Mundial e ex-subsecretário do Tesouro dos Estados Unidos, classificou a invasão como “uma catástrofe global”, lembrando que tanto a Rússia quanto a Ucrânia são grandes produtores de alimentos e respondem por quase 30% de todas as exportações de trigo, produto que nos últimos dias atingiu máxima de 14 anos na bolsa de futuros de Chicago. O conflito, segundo Malpass, poderá criar “um revés econômico duradouro”.

Essas projeções se baseiam não apenas na interrupção das atividades produtivas na Ucrânia, na destruição de parte do país e na crise humanitária traduzida na perda de vidas e em milhões de refugiados em busca de abrigo. O pessimismo se justifica também pelas severas sanções aplicadas à Rússia, que hoje está praticamente isolada do Ocidente.

E como as pequenas e médias empresas (PMEs) brasileiras são afetadas por esse conflito tão distante? Em um cenário de desequilíbrio, que faz disparar os preços de matérias-primas e combustíveis, é quase inevitável que os alimentos encareçam, a inflação suba e com isso se elevem também os juros.

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A questão básica é que o mercado financeiro tem profunda aversão ao risco. Ao menor sinal de ameaça ao cumprimento dos pagamentos no prazo, as instituições buscam meios de se proteger, e a maneira mais rápida e fácil é aumentar o custo dos empréstimos e a exigência de mais garantias. Ou seja, quase automaticamente o crédito fica mais caro e mais difícil de conseguir, e entre as vítimas desse círculo vicioso estão as pequenas e médias empresas, que costumam ter pouco poder de negociação com os bancos.

A esse cenário de guerra se somam também os mais de dois anos de pandemia de covid-19 e a tendência de alta de juros no Brasil iniciada há um ano. Em 16 de março o Conselho de Política Monetária (Copom) anunciou mais uma elevação da Selic, de 10,75% para 11,75%, maior patamar desde 2017, com previsão de novo aumento em maio. Com isso, num ranking de 40 grandes países, a taxa básica da economia brasileira passou a ocupar o segundo lugar entre as mais altas, depois apenas da Rússia.

Juros mais altos significam dinheiro mais caro, o que pesa bastante nas contas das PMEs que têm necessidade de cumprir compromissos urgentes ou fortalecer o capital de giro, ou simplesmente querem investir e seguir em frente. Mas parece que as dificuldades se avolumam, sem falar que estamos em um ano eleitoral que envolve um contexto político extremamente sensível.

Os analistas mais responsáveis ainda não se arriscam a fazer previsões apressadas e afirmam que o impacto real da invasão russa será percebido com mais clareza nos próximos anos, e não somente nos próximos meses. O conflito é um ponto de virada com ondas de choque de longa duração, e o mais sensato é precaver-se e buscar alternativas consistentes, capazes de suportar a volatilidade dos mercados.

No caso das PMEs brasileiras, uma saída para as empresas está nas opções “fora da caixa”, ou seja, aquelas que vão além das regras que os bancos convencionais vêm conseguindo manter há décadas, praticamente sem alterações quando se trata de conceder empréstimos a pequenos tomadores. O conceito de marketplace de crédito, por exemplo, tem provocado uma mudança no mercado financeiro, graças à facilidade de comparação entre financiadores e taxas e a possibilidade de realizar operações que se completam com rapidez e sem burocracia.

Em uma “economia de guerra” como a atual, o essencial para as pequenas e médias empresas é pesquisar com muita atenção tudo o que o mercado oferece. O velho empréstimo bancário já deixou de ser a solução para conseguir crédito. Tempos difíceis requerem imaginação e inteligência para encontrar alternativas que fujam do convencional.

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