Julgamento do STF irá decidir se deve haver divisão de pensão por morte entre viúva e amante
Confira análise de Elisa Cruz, Doutora e Mestra em Direito Civil
Em caso de morte, a amante tem direito à pensão? Como fica o direito sucessório no caso de uma pessoa que mantém duas famílias paralelas? A possibilidade de uma pessoa manter mais de uma família simultaneamente no Brasil estará em debate no Supremo Tribunal Federal (STF), até o dia 2 de agosto, quando os ministros devem retomar o julgamento sobre divisão de pensão por morte entre cônjuge e concubina(o) que está sendo realizada pelo Plenário Virtual do STF. E esse julgamento pode ter implicações que afetam a vida de milhões de brasileiros.
O principal tema em debate no STF no Recurso Extraordinário 883168, em julgamento no plenário virtual, refere-se à possibilidade de uma pessoa manter mais de uma família simultaneamente. E, em consequência, se as(os) viúvas(os) têm direito à divisão da pensão por morte. Em 2008, a 1ª Turma do STF havia julgado o RE 397762 e entendido que não era possível dividir pensão entre cônjuge e concubina (o), porque o direito brasileiro adota a monogamia como princípio jurídico. O julgamento atual, agora, pelo Plenário da Corte, irá decidir se esse precedente irá se manter ou não.
“Para entendermos bem a decisão, é importante saber que o foco é a existência de duas ou mais famílias de forma simultânea e se todas teriam proteção jurídica. É importante esse esclarecimento porque a pessoa casada, mas já separada (de fato ou separação judicial) pode ter união estável, de acordo com o art. 1723, § 1º, do Código Civil, e nessa hipótese só há uma família. O caso em julgamento pelo STF busca decidir se duas ou mais famílias terão proteção jurídica ao mesmo tempo. E, embora o STF esteja decidindo tema previdenciário, isso gera reflexos no direito das famílias e sucessórios, pois o pressuposto para a decisão do STF é se existem direitos à mulher ou ao homem que pertence à “família paralela ou simultânea”, esclarece a professora da FGV Direito Rio, Elisa Cruz.
De acordo com Elisa, quanto à questão de as heranças serem divididas ou não, mantendo-se o precedente de 2008 e os votos até agora inseridos no Plenário virtual, não haverá direito à sucessão nas famílias paralelas. Salvo em favor de descendentes (filhos, filhas, netos, netas e etc.), porque eles não são discriminados independentemente da origem da filiação.
Apesar de haver o reconhecimento da união estável e já ser parte da realidade social e jurídica no Brasil, o tema ainda gera polêmica. As uniões entre pessoas do mesmo sexo, apesar de ainda serem objeto de crítica por alguns setores sociais e políticos, também se consolidaram no Direito. A questão atual é se a família conjugal, isto é, a relação entre pessoas adultas, fica ou não restrita a dois indivíduos.
“Todo esse julgamento reacende o debate se no Brasil devemos adotar um modelo de família formado por duas pessoas (independentemente de sexo ou gênero) ou se outras formas de famílias são possíveis e devem ter seus direitos assegurados. Como é o caso das famílias simultâneas, em que uma pessoa está presente em várias famílias. Ou ‘poliamor’, em que uma a família é formada por três ou mais pessoas com vínculos conjugais”, finaliza Elisa Cruz.
*Elisa Cruz é Doutora e Mestra em Direito Civil pela UERJ, além de Professora da FGV Direito Rio e Pós-Doutoranda na Escola de Serviço Social da UFRJ.