Seguradoras querem trocar depósito por seguro-garantia
Decisão do CNJ no fim de março garantiu a possibilidade de troca de depósitos judiciais por seguro-garantia
Um grupo de seguradoras e advogados quer que a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) aceite um mecanismo de “fast-track” (via rápida) para troca de depósitos judiciais por seguro-garantia.
Em março, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) tomou decisão assegurando essa possibilidade, mas o setor privado avalia que isso não será suficiente para um movimento rápido o suficiente para liberar esses recursos e dar capital de giro às empresas durante a crise do coronavírus. Por isso, querem a concordância da PGFN, vinculada ao Ministério da Economia.
Segundo Jorge Sant’Anna, diretor-presidente da BMG Seguros e que está liderando o grupo, a ideia é que esse mecanismo de liberação mais rápida dessa operação de troca permita a injeção de R$ 20 bilhões a R$ 30 bilhões em capital de giro. A iniciativa teria foco em alguns segmentos da economia, em tese mais afetados pela crise.
“Há um grande empoçamento de liquidez e um grande volume de depósitos decorrentes de disputa tributária”, disse Sant’Anna. Responsável por receber os depósitos relativos a disputas entre a União e os contribuintes, a Caixa Econômica Federal, depois de relutar em passar os dados, informou que nos últimos três anos os ingressos brutos somaram R$ 57,16 bilhões, e o estoque estava em R$ 90,1 bilhões no fim de 2019.
Quando recolhido em disputas com a União, esse dinheiro é contabilizado como receita, ou seja, ajuda as contas fiscais. A decisão do CNJ no fim de março garantiu a possibilidade de troca de depósitos judiciais por seguro-garantia. Com esse estoque, a medida representa um risco fiscal para a União, pois a troca significa despesa pública. O risco também vale para Estados e municípios, que têm receita inclusive de depósitos privados.
Segundo Sant’Anna, nos últimos dois meses já vinha crescendo a opção por seguro-garantia em detrimento dos depósitos tradicionais, mas a PGFN ainda estaria conseguindo em vários tribunais barrar a troca daquilo que já existe. Por isso, explica, a intenção do grupo, que envolve também o ressegurador IRB, é convencer o Ministério da Economia a fazer um programa no qual definiria que setores teriam acesso mais rápido a essa possibilidade de troca sem que a PGFN tentasse barrá-la.
“Estamos pedindo para criar um processo na PGFN que, para que determinados critérios e para determinadas empresas, ela já considere pacificada a discussão sobre a troca”, disse Sant’Anna. “A gente está avaliando quais seriam os setores, precisa discutir com a Secretaria de Política Econômica”, completou, após mencionar exemplos como varejo e turismo.
Em nota, o IRB disse que busca com os demais atores uma “aprovação célere” dessa proposta. “O mercado de seguro-garantia está travado por causa do cenário que vivenciamos e esse projeto contribui para melhorar o fluxo de irrigação de recursos para nossa economia”, diz a resseguradora.
Cássio Gama, sócio da área de seguros do escritório Mattos Filho, afirmou que, a despeito do aspecto negocial de interesse do ramo segurador, a medida de fato injetaria capital de giro “na veia” das empresas. “Seria uma forma de gerar liquidez no mercado, pulverizando risco de forma eficiente. E ainda cumpriria a lei, que equipara seguro-garantia a dinheiro”, afirmou.
Segundo ele, um “pool de seguradoras” poderia operar nesse segmento, com procedimento eletrônico e uma plataforma específica que envolveria a PGFN para que a troca do dinheiro pelo seguro fosse feita em questão de horas ou dias. “Hoje, um processo com sucesso demora de 30 a 60 dias. Os juízes ouvem a PGFN e, se ela sinaliza que aceita um ‘fast track’, facilitaria”, disse, explicando que o órgão poderia até, se julgar necessário, propor algumas regras para o seguro-garantia desse tipo de disputa tributária para evitar travar os processos no Judiciário..