Especialistas avaliam cenário das fraudes na saúde suplementar
Evento realizado pela FenaSaúde reuniu representantes de hospitais, laboratórios, planos de saúde, autoridades, representantes do Ministério Público e da Polícia Civil
Com um amplo debate sobre impactos das fraudes na saúde suplementar em suas diferentes perspectivas, o 11º Debates FenaSaúde, realizado em São Paulo (SP) na manhã de 22 de novembro, recebeu aproximadamente 100 pessoas no auditório da Escola de Negócios e Seguros (ENS) e teve mais de 1 mil visualizações na transmissão pelo YouTube.
De acordo com a diretora-executiva da FenaSaúde, Vera Valente, as fraudes são uma realidade na saúde suplementar e suas consequências estão diretamente ligadas à sustentabilidade e à previsibilidade de gastos no sistema de saúde. “Isso tem impacto direto e imediato no sistema e, principalmente, para os beneficiários. Sabemos que há uma série de desafios a serem enfrentados pelo setor que envolvem a ampliação do acesso, as mudanças estruturais vividas pela nossa sociedade em termos demográficos e envelhecimento da população, mudanças no perfil epidemiológico e a inclusão de novas tecnologias que são cada vez mais caras e específicas. Mas é preciso entender que esse cenário atual das fraudes na Saúde Suplementar são como ter um incêndio em um prédio de 20 andares. O primeiro passo é apagar o incêndio daquele andar e depois descobrir as causas e evitar que ele volte a acontecer”.
Durante o primeiro painel “Fraudes na cadeia de saúde: impactos e enfrentamento”, mediado pela jornalista Lúcia Helena Oliveira, Vera reforçou que a FenaSaúde vem dedicando especial atenção ao assunto. “Entretanto, para ter ainda mais sucesso nessa empreitada contra os delitos e fraudadores, é imprescindível que atuemos juntos com os demais elos da cadeia da prestação de serviços na saúde suplementar. Por isso é tão importante ter aqui reunidos, além das operadoras, os prestadores de serviço na figura da Anahp e da Abramed, e também de representantes do Ministério Público e da Polícia Civil”, afirmou a executiva.
Ao abordar a importância do tema no contexto da medicina diagnóstica, Milva Pagano, diretora-executiva da Associação Brasileira de Medicina Diagnóstica (Abramed) lembrou que 60% dos exames são realizados pela saúde suplementar. “Muitos laboratórios têm políticas de compliance, áreas e práticas bem estabelecidas, mas não podemos dizer que este é o retrato de todo o mercado. Por isso, reforçamos a importância deste trabalho em conjunto para coibir e impedir práticas que agridam e coloquem em risco a sustentabilidade do setor”, afirmou Pagano.
Na sequência, o diretor-executivo da Associação Nacional de Hospitais Privados (Anahp), Antônio Britto, enfatizou que o assunto das fraudes tem de ser considerado como um problema do sistema de saúde como um todo. “É um problema público, privado, dos pacientes, dos hospitais, dos médicos. Se não tivermos a compreensão disso não chegaremos a lugar algum.” Na avaliação de Britto, aspectos como o estabelecimento de processos e certificações por parte dos hospitais são algumas das ações necessárias para minimizar o que ele chamou de “zonas cinzentas” que estimulam e propiciam as fraudes no setor.
O segundo painel, sob a moderação da Diretora Jurídica da CNseg, Glauce Carvalhal, discutiu os aspectos jurídicos e criminais no combate às fraudes em saúde e teve como objetivo buscar formas de ampliar os instrumentos jurídicos à disposição para combater, diminuir e punir as fraudes contra o sistema.
Em sua participação, o delegado-chefe da Delegacia de Repressão à Corrupção da Polícia Civil do Distrito Federal, Adriano Valente, falou sobre a investigação que deflagrou aquela que ficou conhecida em 2019 como a “máfia das próteses”, que envolvia o superfaturamento de próteses
com a participação de empresas do setor e profissionais de saúde. Ele lembrou que o fato de não haver tipificações específicas na legislação brasileira para os crimes de corrupção privada dificulta ainda mais esse tipo de investigação.
Na sequência, o promotor do Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ) e coordenador do Grupo de Atuação Especial no Combate ao Crime Organizado (Gaeco), Bruno Corrêa Gangoni, explicou que fez uma pesquisa sobre inquéritos de organizações criminosas no setor e se surpreendeu com o baixíssimo número de ocorrências. “Há poucos inquéritos para questões de investigação de organizações criminosas no setor. Isso surpreende e assusta diante da importância do assunto e das vantagens econômicas que essas organizações criminosas podem estar tendo com as fraudes.”
Em sua fala, o advogado criminalista Rodrigo Fragoso, da Fragoso Advogados, enfatizou o ambiente propicio que está sendo criado pela FenaSaúde e pelos demais elos da cadeia da saúde para a discussão sobre a prevenção e combate às fraudes. “Não é um seminário sobre fraudes contra os planos, e sim de prevenção e combate às fraudes na saúde suplementar. Um ecossistema que atende mais de 50 milhões de brasileiros. A presença do Ministério Público e da Polícia Civil nesse debate é simbólica e uma demonstração inequívoca de que o crime organizado está atingindo a saúde suplementar, da mesma forma que impacta em diferentes áreas da sociedade”, afirmou Fragoso.
Próximos passos
A Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde), entidade que representa 14 grupos de operadoras de planos de saúde que atendem a 41% dos beneficiários do mercado, vem tomando uma série de iniciativas no âmbito da prevenção e combate às fraudes na saúde suplementar. Neste ano, a entidade criou uma Gerência de Prevenção e Combate a Fraudes e formalizou ao Ministério Público de São Paulo uma notícia-crime para apurar fraudes de reembolso no valor de R$ 40 milhões.
Durante o evento, Vera firmou compromisso de continuar realizando os debates com os representantes, entre eles a própria classe médica, para ampliar o debate e continuar brigando pela sustentabilidade do setor. “Estamos com essa notícia-crime e faremos outras, quantas forem necessárias, fazendo análise conjunta de dados, usando inteligência artificial, para que tenha uma demonstração de que as operadoras brigam para cuidar bem dos recursos dos beneficiários – e não podemos permitir que esses recursos estejam sendo usados de forma indevida”, concluiu a executiva.