Seguro mira a diversidade e a inclusão

GT listará ações para mercado atender uma sociedade igualmente diversa

Um workshop no dia 15 de agosto vai oficializar a estreia do mercado segurador no campo da diversidade e da inclusão. Ocorrerá no auditório da Escola Nacional de Seguros, das 14h às 17h30, e planeja antecipar algumas das ações mais relevantes que estarão a cargo do Grupo de Trabalho Diversidade e Inclusão do Setor de Seguros, criado pela CNseg. O GT (*) foi criado no âmbito da Comissão de Sustentabilidade e Inovação, presidida por Maria de Fátima Mendes de Lima (BB Mapfre).

Publicidade

Coordenadora do GT, Ana Paula Santos (Seguradora Assurant) elogia a atitude da CNseg de incluir um tema sensível, relevante e estratégico na sua agenda de trabalho. Uma das ações que estarão a cargo do GT será a publicação de uma cartilha para orientar o mercado a criar programas de diversidade e inclusão. “Um mercado para ser sustentável e inovador precisa olhar para a diversidade”, afirma ela, até porque “a diversidade e a inclusão geram negócios, e por isso pretendemos debater, por meio de fóruns recorrentes, questões relativas à inclusão de mulheres, de idosos, de pessoas com deficiência, de pessoas LGBT, de pessoas de quaisquer etnias e religiões”.

Se hoje houvesse igualdade de gênero na economia brasileira, US$ 850 bilhões poderiam ser adicionados ao PIB do Brasil. Se falarmos globalmente, o número seria US$12 trilhões (Dados Mckinsey Global Institute), lembra Ana Paula Santos, advertindo, contudo, que se engana quem a acredita que a diversidade trata apenas de questões de gêneros. “Diversidade é muito maior que isso…”

Confira a íntegra da entrevista concedida por Ana Paula Santos, na qual ela discute algumas das propostas para tornar o mercado mais igualitário e mais bem preparado para oferecer produtos e serviços para uma sociedade igualmente diversa.

Publicidade
Icatu Seguros no JRS

Olhando o entorno, a missão do GT Diversidade e Inclusão do Setor de Seguros da CNseg, criado para tornar o mercado mais igualitário e mais bem preparado para oferecer produtos e serviços para uma sociedade igualmente diversa, é extremamente complexa e desafiante. Quais as contribuições que poderão emanar desse grupo?

A primeira grande contribuição do GT foi criar um ambiente para que o mercado possa discutir o tema. Notou-se que as seguradoras tinham iniciativas voltadas à diversidade em diversos níveis, algumas com programas estruturados e outras com ações pontuais. Assim, a formação do GT proporcionou que este universo de seguradoras pudesse trocar experiências e boas práticas. Neste sentido, uma das primeiras metas do GT será a criação de uma cartilha para auxiliar o mercado como todo a adotar programas de diversidade e inclusão.

Fale um pouco de como será a rotina de trabalho do grupo e de sua pauta temática?

Um mercado para ser sustentável e inovador precisa olhar para diversidade, e o setor de seguros está atento a isso. Temos representantes de grandes grupos seguradores que estão fortemente comprometidos em fomentar uma cultura inclusiva em nossa sociedade e em seus respectivos ecossistemas. A diversidade e inclusão geram negócios, e por isso pretendemos debater, por meio de fóruns recorrentes, questões relativas à inclusão de mulheres, de idosos, de pessoas com deficiência, de pessoas LGBT, de pessoas de quaisquer etnias e religiões.

Além de gênero, o GT planeja debater a questão racial, discutindo, por exemplo, o empoderamento da mulher negra? Especialistas lembram que os salários entre mulheres negras e brancas também são extremamente desiguais e precisam ser revistos em busca de um modelo de igualdade. Este tema estará na pauta?

Sem a menor sombra de dúvida. Mesmo os negros, representando 53% da população brasileira, ainda são minorias em nossas empresas e nos cargos de gestão. Ser negro e pobre em nosso país é muito difícil; agora ser negra, pobre e mulher é infinitamente mais difícil. Portanto, não dá para falar de diversidade sem tratarmos de questões como essa. Engana-se quem a acredita que a diversidade trata apenas de questões de gêneros. Diversidade é muito maior que isso. O indivíduo, por natureza, é diverso. Como já dito, questões de diversidade tratam da inclusão de mulheres, de idosos, de pessoas com deficiência, de pessoas LGBT, de pessoas de quaisquer raças, etnias e religiões. Programas de Diversidade visam incluir social e economicamente qualquer pessoa, sem quaisquer tipos de preconceitos e independente de sua natureza ou escolha. É isso que queremos difundir em nosso mercado e em nossa sociedade.

Em todo o mundo, as desigualdades de gênero são recorrentes. O que precisa mudar para acabar com as desigualdades: as mulheres ou o sistema?

A sociedade como um todo entender e ser educada sobre o tema. E não se trata apenas de uma discussão de direito, mas também uma questão econômica. Se hoje houvesse igualdade de gênero na economia brasileira, US$ 850 bilhões poderiam ser adicionados ao PIB do Brasil. Se falarmos globalmente, o número seria US$12 trilhões (Dados Mckinsey Global Institute). Ou seja, para haver uma maior geração de riquezas em nosso país e no mundo, bastaria incluirmos mais mulheres nesta equação.

Estamos de fato errando na estratégia na condução de nossos negócios. O mercado corporativo deveria criar condições para que as mulheres trabalhem, estudem, tenham momentos de lazer, possam criar seus filhos e cuidar de suas famílias de forma equilibrada. E isso também vale para os homens. Afinal, se seu cônjuge compartilha contigo de horários de trabalho mais flexíveis, ambos poderão atuar juntos nas atividades da casa, por exemplo. Sou a favor, por exemplo, de uma licença paternidade mais justa para os homens. Tenho inúmeros colegas homens que abrem mão de suas férias para acompanhar suas esposas no primeiro mês de seus filhos – seria esse o modelo correto? Por que não dar ao homem o benefício de acompanhar o primeiro mês do seu filho?

A diferença de salários entre homens e mulheres é sinal mais claro da discriminação de gêneros ou existem outros indicadores da desigualdade no ambiente de trabalho? Quais? Como estas questões são tratadas no mercado de seguros?

Se verificarmos atentamente, é fácil notar que participação da mulher no mercado de trabalho hoje é, majoritariamente, nas áreas de suporte e não nas áreas de negócio, o que chega a ser um non-sense. Afinal, a decisão de compra de um produto, normalmente, pertence a uma mulher. Ou seja, se normalmente a decisão de compra é da mulher, por que não é ela que está direcionando o negócio em nosso mercado? Não adianta criar o “Seguro Mulher”, se uma mulher não participou da sua criação. As empresas precisam ser coerentes em suas estratégias, precisam dar voz e ferramentas para a participação da mulher no direcionamento de seus negócios.

Há muito barulho e repercussão na mídia sobre desigualdade, mas as empresas continuam perdendo mulheres de talento, porque o ambiente de trabalho não tem espaço para a vida delas… o que fazer?

Precisamos criar ferramentas para essas mulheres. A tecnologia se tornou uma grande aliada da mulher. Muitos acreditam que, desde o advento do celular e do smartphone, houve uma certa escravidão ao trabalho. Eu já penso que não. A tecnologia para mim foi uma libertação, a possibilidade de responder e-mails de forma remota e realizar conferências via vídeo ou telefone tornou a vida da mulher- e consequentemente do executivo- mais ágil. Eu não preciso estar fisicamente presente para atender ao meu CEO; basta que ele me ligue ou encaminhe uma mensagem que poderei atendê-lo imediatamente ou mesmo na hora mais conveniente para ambos. Cursos on-line são outro exemplo. Uma das minhas colaboradoras decidiu fazer uma pós-graduação, e, como ela é mãe de um bebê de colo, decidiu fazer o curso de forma on-line, pois teria mais liberdade com seus horários. Sensacional. É dessa criatividade que precisamos. Poder estudar na hora que lhe for mais conveniente é uma libertação sem precedentes. Além disso, e aqui finalizo, precisamos criar meios de empoderar e encorajar a mulher a assumir cargos de liderança, e não forçá-la a fazer escolhas.

Mesmo na Suécia, onde a licença remunerada dos pais, por exemplo, data da década de 70, oferecendo-lhes 480 dias de convivência com filho recém-nascido (e depois, subsídio do governo para as creches), há queixas da desigualdade por gênero. A Suécia, onde mais de 80% das mães trabalham, ocupa a primeira posição entre as nações industrializadas em relação à igualdade de gênero no setor público, segundo dados da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico). Mas pesquisas mostram que, no setor privado, a igualdade entre homens e mulheres está longe de ser realidade. Em 2016, por exemplo, mais de 80% dos gerentes das empresas suecas que tinham ações negociadas na bolsa eram homens.

O que se tem notado é que mesmo em sociedades mais maduras e desenvolvidas, onde as tarefas da casa são divididas igualmente entre os genitores, recai ainda na mulher a maior responsabilidade na criação do filho. Obviamente, a escolha e o planejamento de carreira pertencem a cada indivíduo, e muitas mulheres, assim como alguns homens, escolhem ficar em casa nos primeiros anos de vida do seu filho. E, algumas vezes, tendem a desistir de uma carreira para cuidar exclusivamente dos filhos e da casa, e isso acontece em todos os países. Entretanto, precisamos ter em mente que a nossa geração e as gerações futuras viverão mais, sendo a mulher normalmente o gênero mais longevo. Assim, a mulher, ao tomar a decisão de ficar em casa, ela deixa de contribuir financeiramente para seu patrimônio e para sua aposentadoria, o que se transforma numa enorme injustiça.

Não há dúvidas que trabalhar em casa é um trabalho que deveria ser altamente remunerado, mas infelizmente não é. Por isso, a equidade de gêneros não se trata somente de proteger um direito constitucional, amparado na maioria das legislações mundiais, é uma questão econômica. A maioria da população precisa trabalhar para seu sustento e planejamento de uma aposentadoria, portanto a mulher que abre mão do teu trabalho remunerado poderá gerar um déficit financeiro em seu futuro e no futuro dos filhos pelos quais abriu mão de sua carreira.

Artigos Relacionados