Seguro Não é Caridade

Confira o artigo do acadêmico da ANSP e sócio fundador da C.Josias & Ferrer, Carlos Josias Menna de Oliveira

Nos meios do setor a assertiva pode até parecer primária, básica, e é mas, não é o que se vê quando a matéria chega ao grande público através de muitos dos meios de comunicação existentes, infelizmente.

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Certo que o conhecimento do contrato de seguro ganhou imenso impulso com o advento do CDC, inclusive pelo Judiciário, que em tempos passados exclamava ser desconhecido, entretanto isto não tornou, ainda, claro que o seguro, embora tenha uma função social bem definida, não se trata de uma porta aberta para amparar a dificuldades de todos, e sim um contrato bilateral entre partes com fixação de riscos bem definidos, deveres e obrigações específicas.

Nesta linha, o mutualismo parece não ter sido ainda bem compreendido por muitos, mesmo aqueles que possuem esclarecimentos suficientes – ou deveriam possuir – e acessos a estes, para bem poder distinguir a obrigação do segurador em razão daquele contrato e a caridade.

É público que o Estado do RS atravessa sérios problemas face trágicos eventos da natureza, ciclones, temporais, vendavais, que desabam sobre certas regiões arrastando vidas e causando destruição de todo tipo, provocando enormes perdas materiais devastando propriedades, acabando com casas, plantações, enfim prejuízos de toda ordem deixando milhares de desabrigados de todas as idades instalando o caos da incerteza, da insegurança e promovendo comoção no país inteiro, preocupando o Estado como um todo.

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Óbvio que se impõe reconstrução.

Faz dois dias escutava um programa de uma rádio de grande audiência no RS – uma ´repetidora` do Grupo Globo, no iniciar da tarde, e flagro um gigantesco, grave e perigoso equívoco. O programa apresenta um modelo bem comum, de notícias, entrevistas e, claro, opiniões nem sempre pertinentes dos apresentadores – no caso um rapaz que faz, também, tipo no jornalismo esportivo e uma jovem senhora que trilhou caminho semelhante. O tema, nossa tragédia que gerou e gera prejuízos de grande monta com vítimas fatais e sobreviventes cuja situação beira ao desespero – o que é inegável.

Em busca de soluções ou de amparo para ajuda, auxílio para amenizar esta angustiante situação, que é de responsabilidade do Estado – que recolhe impostos para garantir o bem estar da população – um deles tem uma idéia tida como genial e que liquidaria com o problema. Diz ele:

– Por que as seguradoras não se cotizam e assumem estes prejuízos, pergunta solta no ar para centenas de milhares de ouvintes em todos os cantos, entoada como uma genial e sábia definição conclusiva para o cenário do desastre.

Quase cai da cadeira. Simples e direto. As seguradora se unem e, pronto, está resolvida a questão: o público que ouviu achou muito lógico e pertinente, segue a vida.

Sim.
Não.

Evidente que o segurador não é o responsável por suprir financeiramente tais necessidades – exceto se alguém dos atingidos tenha se precavido contra os riscos e se acobertado deles.

Sob pena de ruína da política de seguros, e de comprometimento fatal de toda numerosa massa segurada, a mágica solução encontrada é absurda. Poderia simplesmente explicar para os proponentes, numa conceituação em sinopse apertada do seguro, que o sistema securitário é um condomínio e que todos os condôminos pagam quando existem perdas neste grupo, danos de fora deste condomínio se forem suportados por ele logo ali os desabrigados estarão nele.

Não há magia.

Fato que no período pandêmico as empresas do ramo entenderam de desprezar a cláusula restritiva alusiva à pandemia, nos contratos dos seus segurados, o que foi louvável, mas atípico, excepcional.

Isto, entretanto, diz com seguros contratados cujos prêmios foram recolhidos, o que enseja uma situação completamente diferente, e até mesmo diante de um clausulado passível, teoricamente, de discussão judicial sobre validade. A atitude, repita-se, louvável do setor, na ocasião, não autoriza que se pense repetir numa situação como a de agora,

No caso da tragédia recente, há uma massa de vitimas e perdas de todos os tipos das quais os que não se precaveram – independente do motivo – estão fora do alcance do benefício. Não há relação entre os episódios

O segurador recolhe prêmios para poder honrar contratos específicos para riscos determinados.

O Estado recolhe tributos de TODOS para a proteção do bem comum, com o que já há um encargo para todos a fim de compor os prejuízos deste horror, este dever de garantia para todos, que é do Estado, já está remunerado para isto.

Não, o seguro não pode ser entendido de outra forma.

Carlos Josias Menna de Oliveira
OAB/RS 16126
Advogado Sócio Fundador da C. Josias e Ferrer Advogados Associados

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